quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Bons pra mim



Não vejo mais nada, não conheço mais ninguém. Não tenho mais forças para dar passos adiante, pelo medo de cair. A cada dia que passa, mais incapaz de andar sozinho, ainda mais frágil e sensível. Onde eu vou parar com tamanha inutilidade? Quem vai querer cuidar de alguém que não se mexe, de alguém com capacidade mental limitada? As minhas unhas estão feias, as minhas roupas tão marrons, meus olhos tão sensíveis à luz. Pele marcada, os dias quase contados, e o só consigo me lembrar de algo bom, nas fotografias monocromáticas e envelhecidas, borradas pelo tempo, cheirando à gaveta. À muito tive muitos ao meu lado, mas a vida levou todos, os que eram bons pra mim e os que eram apenas bons. O que me conforta é que novos bons pra mim virão e ainda tenho muitos anos pela frente para conhece-los. 20 anos, na flor da idade, não preciso desse drama todo porque alguém não se saiu como eu esperava. Eu vou sim voltar a enxergar as pessoas que me enxergam. Eu preciso andar pra frente novamente e sozinho, quem quiser que me acompanhe pois tenho a pressa da juventude correndo nas veias. Vou me mexer, vou pensar, vou escrever, vou amar, fazer as unhas e trocar de roupa. Não quero mais essa cara toda amassada por quem não merece, eu vou é sair amassando umas caras por aí. Que venham os bons pra mim, e que eu seja bom pra todos, afinal, o tempo passa, eu vou envelhecer e quando eu estiver como no começo no texto, mas sem ter como voltar atrás, quero ter lindas fotografias monocromáticas e envelhecidas, borradas pelo tempo e cheirando à gaveta. Pois o tempo passa e leva os bons, mas os bons pra mim, vão ser bons pra mim a vida toda.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Condições


Para ser amor, não basta deixar marcas no corpo, tem que tatuar a alma e o coração. Tem que fazer pesar as pálpebras enquanto consuma e enquanto consome. Não basta ser quente, tem que arder, ferir e coçar. Para ser amor, tem que vir todo dia, tem que ter toda hora durante toda a vida até o corpo não aguentar mais, pois vai além do corpo, tem que ir além do suor, é preciso lacrimejar. Só é amor se o corpo falar em várias línguas, se as mãos forem capazes de ler em braile e se o paladar ainda funcionar, mesmo com a boca seca. Não é amor se não causar dor. Não é amor se não houver torpor. Não é amor se não tiver cheiro, forma e cor.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Cobras e portas trancadas

As vezes eu fico me perguntando, "o que foi que fizeram com o EU TE AMO". As pessoas simplesmente passaram a amar tudo e todos. Ama a família, ama o cachorro, ama o colega que se faz de amigo, diz que ama um cara por causa de tórax e bísseps, ama uma garota por causa da boca carnuda e ama o sexo oral que ela poderia fazer com toda aquela carne labial. Se esse for o conceito contemporâneo, pós-moderno, ou seja lá o que for, de amor, eu vou morrer seco, pensando que isso tudo não passa de um "gostar muito". No passado as pessoas morriam de amor, por quê sabiam amar, e levavam esse sentimento até as últimas consequências. Hoje, se morre de amor por não saber o quanto o sentimento se tornou desconhecido. É como entrar em um quarto escuro com milhares de portas trancadas e cobras espalhadas pelo chão, e se você não dançar em linha reta, uma cobra te morde e não importa pra qual porta você rasteje, ela vai estar sempre trancada. O bom é que você olhava de fora, ouvia algumas conversas e nas piores situações, o amor e o relacionamento com outra pessoa ainda era colorido e cheirava a chocolate com jujuba. E onde estavam as cobras? E as portas trancadas quando você queria fugir, onde elas foram parar? Elas ainda estão no amor. O cheiro de chocolate com jujuba vinha do "gostar muito". O amor é bom, é gostoso, faz bem, mas se você amar quem você merece amar, e não quem você quer amar. Nem tudo que é bonito e cheiroso, é uma flor, e olha que a mais bela das flores pode te ferir com espinhos. Enquanto humanos, sentimos, e sentimos muito mais quando amamos, pois toda gota d'água confusa, pode virar um mar em crise epilética. Sabe porquê dói quando acaba? Por que demos amor à um chocolate com jujuba. Nós é que ficamos com as cobras e as portas trancadas, e ainda estamos lá, no quarto escuro. Falando assim, parece que o amor é o pior e mais ilusório dos sentimentos, mas ele não é. O falso amor é que é ilusório, é superficial, é que tem cheiro de chocolate com jujuba só para te atrair e te deixar preso em uma prisão sem muros. O amor não, o amor se encaixa e aí sim vem a fantasia de amor para amor; as cobras dançam e se entrelaçam e formam aquela escultura excêntrica, as portas se abrem, a luz entra... Mas até isso acontecer, prepara o remédio pra dor de barriga que ainda tem muito doce pra comer, e não adianta, antes disso, vamos sempre lidar com as cobras sozinhos.